Entrevista com Pe. Jardim Moreira, na Focussocial



Padre Jardim Moreira
Preside há 25 anos à Rede Europeia Anti Pobreza, em Portugal

“A luta contra a pobreza só interessa pelas pessoas;
lutar por uma ideologia não importa.

Nós não lutamos contra os outros, lutamos pelos outros”


É, desde1991, altura em que a EAPN (Rede Europeia Anti-Pobreza, traduzindo as siglas do inglês) foi fundada em Portugal, o timoneiro desta organização não-governamental que tem por missão lutar contra a pobreza e a exclusão social. Uma luta que lhe assenta como uma luva dada a sua longínqua vocação para fazer do mundo um lugar mais justo e equitativo. Também pela via da fé. E sem desanimar. Aos 75 anos, o Padre Jardim Moreira, dono de uma vitalidade ímpar, não baixa os braços nem se sente desiludido com o seu combate. Homem de intuições, foi ainda criança que se sentiu chamado para a vida eclesiástica onde está com profunda convicção e sentido de missão, não dissociando a sua ação social da sua ação pastoral. No seu entender tudo se urdiu para ser um padre interventivo, afincado na luta contra a pobreza que desde cedo o motivou. Mas remete para a ordem do inexplicável o apelo que sentiu, ainda criança, para o sacerdócio.

Recorda como se fosse hoje. Foi ter com a mãe, nas lides do linho, na sala, e disse-lhe que queria ser padre. Assim, sem mais, numa idade de outros sonhos e desejos. Recorda tudo com tamanha nitidez que se lembra, até, dos objetos em volta. Da lançadeira, por exemplo, esse utensílio em forma de barco em que anda a canela do fio da urdidura. “Acredito na voz silenciosa e misteriosa que me ilumina. É difícil exprimir o que ultrapassa a lógica”, diz, olhos postos dentro de si, tão convictamente, que nos leva a admitir, sem vacilo, esses enigmas mudos que a vida tem. E a fazer leituras menos óbvias, interpretando sinais, implícitos naquele cenário da infância, tão pleno de significado. Uma mãe a urdir linho; um filho, menino, ainda, a auspiciar o seu futuro. Quem conhece a história, como não rememorar Santa Isabel da Hungria, tantas vezes representada com uma roca, por tecer roupas para os pobres? Ou então, aludir à carga simbólica da própria tecelagem, nomeadamente na tradição islâmica, onde representa a estrutura e o movimento do universo, trabalho de criação passível de traduzir uma anatomia misteriosa do homem. De qualquer modo, a profecia inocente concretizou-se. O então menino Agostinho Cesário foi ordenado padre no dia 15 de Agosto de 1966. Pároco das freguesias da Vitória, de S. Nicolau e da Irmandade das Almas de S. João das Taipas, no Porto, reitor da Igreja de S. João Novo, o seu trabalho pastoral e social é amplamente reconhecido. Está de pedra e cal, desde sempre, do lado dos mais desfavorecidos, empenhado até ao tutano na defesa dos seus direitos e da sua dignidade. Presidir à EAPN Portugal, Rede Europeia Anti Pobreza, foi mais um desígnio da sua vida que voltava a aceitar com serenidade e a certeza de que é possível erradicar a pobreza do mundo. Apesar de não ser uma luta fácil, “hoje, como no passado, não nos falta nem faltará coragem, persistência e determinação”, assegura Jardim Moreira, acrescentando que “a luta contra a pobreza só interessa pelas pessoas; lutar por uma ideologia não importa. Nós não lutamos contra os outros, lutamos pelos outros. É por isso que, muitas vezes, as políticas não funcionam. As pessoas, a sua dignidade, tem de ser colocada à frente, a união tem de ser feita em torno do ser humano, da sua unicidade enquanto pessoa”.

Para além de ser um homem de fé, mas não um mero “funcionário do templo” acredita que “ninguém pode usar o poder que não seja para servir os outros e não para se servir. O poder tem de ser usado para combater a infelicidade injusta das pessoas. Vejo a realidade perigosa. Mas sou otimista porque tenho fé e acredito num mundo de amor e não em marionetas de falsa felicidade”.

A FOCUSSOCIAL dá-lhe a conhecer um pouco mais do Padre Jardim Moreira, homem de valores, carácter, persistência mas também dono de “uma santa ousadia. Porque se a ousadia não fosse fundada em Deus era loucura”.
De resto, defende a igreja pobre do Pacto das Catacumbas onde se defende que os padres devem viver um estilo de vida simples e exercer o seu ministério pastoral de acordo com critérios evangélicos. E, na senda de Tiago, o apóstolo, acredita que “fé sem obras é morta”. Fiquemos então a conhecer um pouco mais da sua personalidade forte e coerente ao ponto de – é só uma imagem – não precisar de se paramentar para ser quem é. E defeitos? Também os admite. “Tenho as minhas limitações e, com a idade, as físicas aumentam. Mas temos de ter a humildade de gostar de quem somos”. 

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