17 de Outubro – Dia Internacional Para a Erradicação da Pobreza
A POBREZA E A DEMOCRACIA SÃO IMCOMPATÍVEIS
Mensagem da EAPN Portugal
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O CONTEXTO GERAL
A profunda crise financeira e económica, de alcance mundial, e os efeitos que dela derivaram e que se começaram a fazer sentir no ano 2008 estão a afetar de forma muito significativa o modelo social europeu, em particular nos países do sul da União Europeia (UE).
O impressionante aumento de pessoas a viver em risco de pobreza - atualmente 120 milhões! - é um escândalo e um sinal irrefutável e muito preocupante de que a UE não está a conseguir oferecer nenhum sinal de esperança de uma solução abrangente para a crise, com a maioria dos países a priorizar a austeridade como parte da solução, predominantemente neoliberal, liderada pelos mercados e por soluções macroeconómicas.
Especialmente em países sob programas da Troika, como é o caso de Portugal, os efeitos perversos das prioridades macroeconómicas focalizadas na austeridade são já claramente identificáveis: a queda do limiar de pobreza como paradigma do fenómeno do empobrecimento generalizado da população; o aumento dos trabalhadores pobres associados ao aumento do desemprego; o crescimento da pobreza infantil; o progressivo desmantelamento do estado social e o aumento das desigualdades sociais colocam-nos perante o desafio de uma mudança urgente.
Hoje, mais do que nunca, quando falamos de pobreza e exclusão social num contexto de crise económica e social, estamos perante um problema que atinge massivamente uma grande parte da população no nosso país. Sendo certo que esta realidade afeta todas as classes sociais, obviamente o seu impacto é mais sentido nos grupos sociais mais desfavorecidos.
Se por um lado, o esforço financeiro gerado pelas medidas negociadas com a Troika está a afetar drasticamente aqueles que possuem menos recursos e que mais dependem de ajudas do Estado, quer seja pela situação de desemprego, doença, incapacidade ou outra, não é menos verdade que estes efeitos são transversais à sociedade portuguesa.
Muitos dos direitos económicos e sociais básicos estão actualmente a serem postos em causa ou, em parte significativa, a serem negligenciados. Em 2013/2014, o Governo e a Troika decidirão sobre um corte permanente de cerca de €4 mil milhões na despesa pública, na sua maioria em áreas muito relevantes do Estado-Social (saúde, educação, pensões e protecção social).
ANÁLISE POR ÁREAS ESPECÍFICAS
Politicas Macroeconómicas
As politicas macroeconómicas continuam a priorizar a austeridade: com um aumento dos cortes nos serviços públicos e benefícios/pensões, privatizações e cortes salariais. Este tipo de políticas tem prejudicado o consumo, a recuperação económica e têm gerado um aumento da pobreza, minando as bases do Estado Social.
O fosso das desigualdades está a aumentar por via do ataque aos níveis de rendimento (salários e apoios ao rendimento) e do falhanço ao nível de uma distribuição mais justa, por meio de uma tributação progressiva. Isto põe em causa a coesão social e a estabilidade.
Políticas de Emprego
As medidas de políticas não têm sido bem-sucedidas em termos da criação de emprego. Pelo contrário, o desemprego aumentou de forma expressiva mantendo as pessoas presas na armadilha da pobreza perpétua.
A qualidade do trabalho e do emprego deteriorou-se e permanece sem solução. Não há investimento na criação de empregos de qualidade e muitos postos de trabalho existentes são precários e de baixa remuneração. Por outro lado, os desempregados, especialmente aqueles que se encontram em situação de maior vulnerabilidade, estão a ser penalizados através de políticas e práticas de ativação compulsivas.
Educação e Politicas de Formação.
As medidas propostas são contra produtivas para a realização significativa das metas de Educação estabelecidas na Estratégia Europa 2020. Algumas medidas terão até efeitos muito negativos, particularmente sobre a pobreza infantil.
A política de educação não está definida com base numa abordagem inclusiva suficientemente ampla. Tal abordagem deveria ter em vista o bem-estar em sentido amplo e ter impacto na redução da pobreza, na inclusão social e na igualdade de oportunidades, especialmente dos grupos mais vulneráveis e, em particular, das crianças que vivem em situação de pobreza.
O apoio financeiro consistente às políticas educacionais está ameaçado pela austeridade e consolidação fiscal. A educação é uma das áreas mais atingidas por cortes na despesa social, e o progresso ao nível da concretização das metas para uma educação mais inclusiva não pode ser feito sem um investimento adequado.
Políticas de Combate à Pobreza
O objectivo de redução da pobreza não está ser levado a sério. A falta de transparência, visibilidade e coerência na escolha e utilização dos indicadores mina o papel fundamental que o objectivo poderia desempenhar na condução das prioridades para a redução da pobreza.
É fundamental implementar uma Estratégia Europeia e estratégias nacionais integradas para combater a pobreza. O investimento social pode ter um papel chave e deve desafiar a austeridade no sentido de fazer um maior investimento na protecção social universal.
Participação e Governança
As organizações que trabalham com e para as pessoas em situação de pobreza e exclusão social têm sido remetidas para um papel secundário sem terem oportunidade de se envolverem e participarem no processo de elaboração dos Relatórios Sociais Nacionais, o que, consequentemente, não lhes permite usufruírem de um espaço legítimo para influenciarem o atual conteúdo das políticas. É fundamental implementar uma participação significativa e de todas as partes interessadas. O envolvimento do Parlamento Nacional na definição de políticas de combate à pobreza é uma emergência.
APELOS
A Pobreza não é um acidente. É uma escolha política e económica. Por isso mesmo apelamos a todos os responsáveis políticos: façam agora a escolha contrária, antes que seja tarde demais!
A credibilidade política é fundamental, especialmente num momento em que grande parte dos cidadãos europeus começam a não acreditar em nada e, acima de tudo, a não confiar em nenhuma forma de poder político democrático. Existe um risco muito forte de se quebrar completamente a coesão social e abrirmos portas ao pior dos cenários: o aumento do ódio e do populismo político que pode conduzir-nos ao abismo que já experienciamos na nossa História recente.
É por estas razões que continuamos a insistir: combater a pobreza agora, não é apenas garantir uma vida melhor para uma grande parte dos cidadãos europeus que vivem em condições de enorme desfavorecimento; combater a pobreza agora, é salvar a Democracia e a Liberdade.
Assim, a mensagem geral da EAPN Portugal é de uma profunda preocupação com a chocante falta de progresso na meta da pobreza, a fraca visibilidade da Estratégia Europa 2020 nos Programas Nacionais de Reforma e o inaceitável défice democrático e participativo.
Neste contexto, apelamos para a absoluta urgência de:
1. Dar prioridade aos objectivos de luta contra a pobreza na agenda política e desenhar e implementar uma Estratégia Nacional de Luta contra a Pobreza e a Exclusão Social, que aborde a multidimensionalidade do fenómeno pela congregação articulada das diferentes estratégias específicas, bem como das diferentes políticas e medidas necessárias (na área do emprego, da educação e formação, da saúde, da proteção social, da habitação, etc.) para atingir os seus objetivos. Esta estratégia poderá – e deverá! – ser parte integrante do próximo Quadro Comunitário de Apoio (2014-2020) e a sua elaboração, implementação e monitorização deve contar com uma ampla participação da sociedade civil e, em particular, com a voz daqueles que mais diretamente experienciam estes fenómenos.
2. Implementar políticas capazes de produzir uma mais justa redistribuição dos recursos – reverter o aumento dos trabalhadores pobres mediante a regulação de “salários dignos” e o acesso a um rendimento mínimo adequado.
3. Reforçar o papel do Estado como provedor do bem comum e da inclusão e coesão social, de forma a garantir o bem-estar universal e equitativo e os serviços necessários para a concretização desse bem-estar, nomeadamente aqueles que previnem as situações de pobreza e exclusão social.
4. Combater o desemprego e promover o crescimento com base em empregos de qualidade, remunerações justas, políticas de formação adequadas e incentivos para a inclusão de jovens e dos trabalhadores mais idosos. A este nível importará contar com uma desejável, e seguramente muito positiva, participação da Economia Social.
5. Adoção de uma Estratégia de Inclusão Ativa tendo em vista uma ação integrada das 3 áreas centrais da estratégia: acesso a um rendimento adequado, a um mercado de trabalho inclusivo e o acesso a serviços de qualidade, incluindo aqueles que mais diretamente se relacionam com a educação / formação.
6. Iniciar, de forma coerente e equitativa, a consolidação de políticas capazes de assegurar uma maior justiça fiscal e melhores políticas orientadas para combater a desigualdade.
EAPN Portugal / Rede Europeia Anti-Pobreza * Outubro 2013
A POBREZA E A DEMOCRACIA SÃO IMCOMPATÍVEIS
Mensagem da EAPN Portugal
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O CONTEXTO GERAL
A profunda crise financeira e económica, de alcance mundial, e os efeitos que dela derivaram e que se começaram a fazer sentir no ano 2008 estão a afetar de forma muito significativa o modelo social europeu, em particular nos países do sul da União Europeia (UE).
O impressionante aumento de pessoas a viver em risco de pobreza - atualmente 120 milhões! - é um escândalo e um sinal irrefutável e muito preocupante de que a UE não está a conseguir oferecer nenhum sinal de esperança de uma solução abrangente para a crise, com a maioria dos países a priorizar a austeridade como parte da solução, predominantemente neoliberal, liderada pelos mercados e por soluções macroeconómicas.
Especialmente em países sob programas da Troika, como é o caso de Portugal, os efeitos perversos das prioridades macroeconómicas focalizadas na austeridade são já claramente identificáveis: a queda do limiar de pobreza como paradigma do fenómeno do empobrecimento generalizado da população; o aumento dos trabalhadores pobres associados ao aumento do desemprego; o crescimento da pobreza infantil; o progressivo desmantelamento do estado social e o aumento das desigualdades sociais colocam-nos perante o desafio de uma mudança urgente.
Hoje, mais do que nunca, quando falamos de pobreza e exclusão social num contexto de crise económica e social, estamos perante um problema que atinge massivamente uma grande parte da população no nosso país. Sendo certo que esta realidade afeta todas as classes sociais, obviamente o seu impacto é mais sentido nos grupos sociais mais desfavorecidos.
Se por um lado, o esforço financeiro gerado pelas medidas negociadas com a Troika está a afetar drasticamente aqueles que possuem menos recursos e que mais dependem de ajudas do Estado, quer seja pela situação de desemprego, doença, incapacidade ou outra, não é menos verdade que estes efeitos são transversais à sociedade portuguesa.
Muitos dos direitos económicos e sociais básicos estão actualmente a serem postos em causa ou, em parte significativa, a serem negligenciados. Em 2013/2014, o Governo e a Troika decidirão sobre um corte permanente de cerca de €4 mil milhões na despesa pública, na sua maioria em áreas muito relevantes do Estado-Social (saúde, educação, pensões e protecção social).
ANÁLISE POR ÁREAS ESPECÍFICAS
Politicas Macroeconómicas
As politicas macroeconómicas continuam a priorizar a austeridade: com um aumento dos cortes nos serviços públicos e benefícios/pensões, privatizações e cortes salariais. Este tipo de políticas tem prejudicado o consumo, a recuperação económica e têm gerado um aumento da pobreza, minando as bases do Estado Social.
O fosso das desigualdades está a aumentar por via do ataque aos níveis de rendimento (salários e apoios ao rendimento) e do falhanço ao nível de uma distribuição mais justa, por meio de uma tributação progressiva. Isto põe em causa a coesão social e a estabilidade.
Políticas de Emprego
As medidas de políticas não têm sido bem-sucedidas em termos da criação de emprego. Pelo contrário, o desemprego aumentou de forma expressiva mantendo as pessoas presas na armadilha da pobreza perpétua.
A qualidade do trabalho e do emprego deteriorou-se e permanece sem solução. Não há investimento na criação de empregos de qualidade e muitos postos de trabalho existentes são precários e de baixa remuneração. Por outro lado, os desempregados, especialmente aqueles que se encontram em situação de maior vulnerabilidade, estão a ser penalizados através de políticas e práticas de ativação compulsivas.
Educação e Politicas de Formação.
As medidas propostas são contra produtivas para a realização significativa das metas de Educação estabelecidas na Estratégia Europa 2020. Algumas medidas terão até efeitos muito negativos, particularmente sobre a pobreza infantil.
A política de educação não está definida com base numa abordagem inclusiva suficientemente ampla. Tal abordagem deveria ter em vista o bem-estar em sentido amplo e ter impacto na redução da pobreza, na inclusão social e na igualdade de oportunidades, especialmente dos grupos mais vulneráveis e, em particular, das crianças que vivem em situação de pobreza.
O apoio financeiro consistente às políticas educacionais está ameaçado pela austeridade e consolidação fiscal. A educação é uma das áreas mais atingidas por cortes na despesa social, e o progresso ao nível da concretização das metas para uma educação mais inclusiva não pode ser feito sem um investimento adequado.
Políticas de Combate à Pobreza
O objectivo de redução da pobreza não está ser levado a sério. A falta de transparência, visibilidade e coerência na escolha e utilização dos indicadores mina o papel fundamental que o objectivo poderia desempenhar na condução das prioridades para a redução da pobreza.
É fundamental implementar uma Estratégia Europeia e estratégias nacionais integradas para combater a pobreza. O investimento social pode ter um papel chave e deve desafiar a austeridade no sentido de fazer um maior investimento na protecção social universal.
Participação e Governança
As organizações que trabalham com e para as pessoas em situação de pobreza e exclusão social têm sido remetidas para um papel secundário sem terem oportunidade de se envolverem e participarem no processo de elaboração dos Relatórios Sociais Nacionais, o que, consequentemente, não lhes permite usufruírem de um espaço legítimo para influenciarem o atual conteúdo das políticas. É fundamental implementar uma participação significativa e de todas as partes interessadas. O envolvimento do Parlamento Nacional na definição de políticas de combate à pobreza é uma emergência.
APELOS
A Pobreza não é um acidente. É uma escolha política e económica. Por isso mesmo apelamos a todos os responsáveis políticos: façam agora a escolha contrária, antes que seja tarde demais!
A credibilidade política é fundamental, especialmente num momento em que grande parte dos cidadãos europeus começam a não acreditar em nada e, acima de tudo, a não confiar em nenhuma forma de poder político democrático. Existe um risco muito forte de se quebrar completamente a coesão social e abrirmos portas ao pior dos cenários: o aumento do ódio e do populismo político que pode conduzir-nos ao abismo que já experienciamos na nossa História recente.
É por estas razões que continuamos a insistir: combater a pobreza agora, não é apenas garantir uma vida melhor para uma grande parte dos cidadãos europeus que vivem em condições de enorme desfavorecimento; combater a pobreza agora, é salvar a Democracia e a Liberdade.
Assim, a mensagem geral da EAPN Portugal é de uma profunda preocupação com a chocante falta de progresso na meta da pobreza, a fraca visibilidade da Estratégia Europa 2020 nos Programas Nacionais de Reforma e o inaceitável défice democrático e participativo.
Neste contexto, apelamos para a absoluta urgência de:
1. Dar prioridade aos objectivos de luta contra a pobreza na agenda política e desenhar e implementar uma Estratégia Nacional de Luta contra a Pobreza e a Exclusão Social, que aborde a multidimensionalidade do fenómeno pela congregação articulada das diferentes estratégias específicas, bem como das diferentes políticas e medidas necessárias (na área do emprego, da educação e formação, da saúde, da proteção social, da habitação, etc.) para atingir os seus objetivos. Esta estratégia poderá – e deverá! – ser parte integrante do próximo Quadro Comunitário de Apoio (2014-2020) e a sua elaboração, implementação e monitorização deve contar com uma ampla participação da sociedade civil e, em particular, com a voz daqueles que mais diretamente experienciam estes fenómenos.
2. Implementar políticas capazes de produzir uma mais justa redistribuição dos recursos – reverter o aumento dos trabalhadores pobres mediante a regulação de “salários dignos” e o acesso a um rendimento mínimo adequado.
3. Reforçar o papel do Estado como provedor do bem comum e da inclusão e coesão social, de forma a garantir o bem-estar universal e equitativo e os serviços necessários para a concretização desse bem-estar, nomeadamente aqueles que previnem as situações de pobreza e exclusão social.
4. Combater o desemprego e promover o crescimento com base em empregos de qualidade, remunerações justas, políticas de formação adequadas e incentivos para a inclusão de jovens e dos trabalhadores mais idosos. A este nível importará contar com uma desejável, e seguramente muito positiva, participação da Economia Social.
5. Adoção de uma Estratégia de Inclusão Ativa tendo em vista uma ação integrada das 3 áreas centrais da estratégia: acesso a um rendimento adequado, a um mercado de trabalho inclusivo e o acesso a serviços de qualidade, incluindo aqueles que mais diretamente se relacionam com a educação / formação.
6. Iniciar, de forma coerente e equitativa, a consolidação de políticas capazes de assegurar uma maior justiça fiscal e melhores políticas orientadas para combater a desigualdade.
EAPN Portugal / Rede Europeia Anti-Pobreza * Outubro 2013