Viagens Brancas: livro é apresentado hoje, no Porto

 
[duas sessões: centro de respostas integradas(Rua Diogo Botelho, 1651/1653)

 _e_ casa do ló (22h)
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« A grande protagonista não é a cocaína, são as mulheres que com ela de alguma forma se relacionam. Por um lado, o livro evidencia vidas de mulheres com tudo o que é socialmente construído como tipicamente feminino – cuidar dos filhos ou culpabilizar-se por não o fazer, assumir qualquer papel para assegurar o bem-estar de todos a seu cargo, ter menos oportunidades e menos poder, ou ser vítima de formas diversas de violência pela condição de ser mulher.


Por outro lado, o livro desconstrói ideias tradicionais e estereotipadas sobre a mulher, ao mostrar-nos que a sua ligação com as drogas pode ser qualquer uma – a de consumidora ocasional, frequente, dependente, actual, passada, em tratamento, em recuperação ou em recaída –, assim como a sua ligação ao crime também pode ser uma de muitas – tomando o tráfico como exemplo, conhecemos a mulher que trafica para consumir, a que trafica para dar a consumir, a que vê no tráfico um grande negócio, ou apenas uma oportunidade.

Esta dimensão do envolvimento das mulheres no desvio vai mais além no livro “Viagens Brancas”. A participação das mulheres em actividades desviantes pode resumir-se a um papel passivo, heterónomo, coagido, sem controlo, como nos habituámos a pensar no comportamento feminino. Mas também nos é indicado que a mulher pode ter um papel activo, autónomo e controlador na actividade criminal, como conta a Ana Cristina a partir da história de Zany.

As mulheres, de quem não se espera que cometam crimes, ou sequer que se desviem, afinal fazem-no. E, por vezes, da forma racional e determinada que se tende a atribuir em exclusivo aos homens. Prevalece, no entanto, a expectativa social de que as mulheres correspondam a um ideal de feminilidade que passa pela constante conformidade às normas. Esta expectativa tem promovido uma dupla penalização das mulheres que cometem crimes. Por um lado, porque os cometem; por outro lado, porque são mulheres e, como tal, não os devem cometer. Não tenho grandes dúvidas: formal ou informalmente, as mulheres são mais julgadas pela sua maior ou menor conformidade aos papéis de género do que pelos crimes que cometem.
Através das histórias que nos conta, a Ana Cristina Pereira dá-nos uma excelente oportunidade para reflectirmos sobre o impacto da construção social do feminino na vida destas e de outras mulheres.»
Do Pósfacio
Raquel Matos
Professora auxiliar da Faculdade de Educação e
Psicologia da Universidade Católica Portuguesa


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