EAPN Portugal dá, mais uma vez, o seu contributo para a Estratégia Nacional para a Integração das Comunidade Ciganas


[Rosário Farmhouse,  alta-comissária para a Imigração e Diálogo Intercultural e
Padre Jardim Moreira, presidente da EAPN Portugal]



Terminou ontem o período de consulta pública da Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas (ENICC) e a EAPN Portugal já enviou o seu contributo para o Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, entidade que coordena a ENICC.

Desconhecendo, ainda, o processo que irá ser posto em marcha para consensualizar visões, critérios e prioridades relativamente à ENICC, a EAPN Portugal entende que, também por ser um processo inédito, é fundamental trata-lo de forma exemplar para que o esforço de participação e de consensualização de opiniões se concretize na prática.

A trabalhar com as comunidades ciganas há mais de vinte anos, a EAPN Portugal sempre manifestou disponibilidade e interesse em participar ativamente na implementação da ENICC e, por isso, analisou minuciosamente o documento, chamando à atenção para alguns pontos, nomeadamente, para a redação do preâmbulo da estratégia. «Tal como está redigido pode levar a que as pessoas entendam que a dificuldade na integração dos ciganos está, em primeiro lugar, relacionada com a própria comunidade, ou seja, com a sua forma de estar e que a principal mudança terá que ser concretizada pelos próprios», explica o presidente da EAPN Portugal, Padre Jardim Moreira, alertando para o perigo de reforçar um dos piores estereótipos que afecta esta comunidade. «Não queremos que se caia na facilidade de lhes atribuir a responsabilidade por serem pobres, excluídos e discriminados, pois todos sabemos que são vítimas dos mais graves atos de racismo e esta estratégia deve servir também para admitir que uma parte substancial da mudança passa pela capacidade de inverter tal tendência e criar condições para uma efetiva integração social», defende.

Assumindo que a ENICC é uma estratégia de discriminação positiva a EAPN Portugal, alerta para o facto de, à luz da Constituição da República portuguesa, (nº2 do Artigo 13º) poder ser inconstitucional, sugerindo que a produção de um diagnóstico nacional credível, sobre esta comunidade, terá de ser feito de acordo com a lei, permitindo a quem o faça e utilize atuar com dados concretos, imprescindíveis à resolução definitiva do problema.

O presidente da EAPN Portugal remete, ainda, para o enquadramento político desta proposta, chamando a atenção dos decisores. «É importante ter presente que o Plano Nacional de Reforma a que se faz referência não se encontra em vigor nem foi revalidado pelo atual Governo. Portugal submeteu à Comissão Europeia, em abril do ano passado, o Plano Nacional de Reforma (PNR) mas, após a queda do anterior Governo e a eleição do atual executivo, passamos a ter uma agenda própria, exclusivamente relacionada com o memorando de entendimento tripartido (FMI, Comissão Europeia e Estado). Por isso, em momento algum, o PNR foi renovado ou validado. Com isto, as metas e objectivos referidos no presente contexto, formalmente, não existem. De resto, fazer coincidir parte das metas com 2020, supomos que em relação com a Estratégia Europeia 2020, parece-nos desajustado».

Falta estudo nacional sobre as comunidades ciganas
Outra das fragilidades mencionadas pela EAPN Portugal é a falta de um estudo nacional sobre as comunidades ciganas que possa sustentar a ação, combatendo estereótipos e favorecendo a intervenção positiva. Assim, a produção de conhecimento sócio-demográfico fiável e atualizado é fundamental para a concretização e sucesso da estratégia. Para além desta lacuna é, ainda necessário clarificar quais serão os recursos afectos ao projeto.

«Essa ausência é particularmente evidente no quadro-síntese dos objectivos e metas onde falta a identificação de responsáveis diretos e indiretos pela concretização das medidas e os respectivos recursos», concretiza o Padre Jardim Moreira, fazendo notar que a falta de recursos específicos incorre no grave risco de, em parte ou no todo, a estratégia não poder ser concretizada, ficando-se por um plano de intenções».

A este respeito a EAPN Portugal nota, também, que a referência aos fundos estruturais está desfasada uma vez que o atual Quadro de Referência Estratégico Nacional termina em 2013 e parte substancial das medidas pretende ser concretizada depois dessa data.

Por último, mas não menos importante para o sucesso da ENICC, «seria desejável ter em atenção que as comunidades ciganas ocupam diferentes territórios e, por isso, é altamente recomendável que os grupos de trabalho e/ou comissões de acompanhamento contem com a participação de representantes de cada realidade territorial e que a sua nomeação seja feita pelos seus pares e não pelo organismo que coordena a estratégia», defende o presidente da EAPN Portugal, acrescentando «o tratamento digno do ser humano, sem qualquer tipo de discriminação é absolutamente basilar na concretização de uma democracia sadia». MV

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